domingo, 5 de abril de 2009

No Guaíba (AVISO: texto sem sarcasmo)

Certa hora do dia, não importava o que estivesse fazendo, uma hipnose me chamava a andar em direção ao Sol, para a beira do Guaíba. O oeste era meu guia. O pôr-do-sol em Porto Alegre acontece por volta das 8h da noite, em função do horário de verão. Estava sozinha, sentada na pedra, com areia salpicada de pequenas conchas abaixo, e com a trilha do Sol de final de tarde aos meus pés. Barcos de todos os tamanhos interrompiam o espetáculo, ocultavam a esfera laranja por alguns segundos. Mas o Sol não reclamava. Se punha em silêncio, inocente e puro, sem consciência da sua força e beleza. Se escondia com a humildade que só um astro que proporciona vida pode ter. Foi também em silêncio que eu permaneci, esperando a mudança das cores. Vermelhos, laranjas, rosas, azuis. Certa hora, os pássaros negros mergulharam todos nas águas do lago, deixando somente seus finos pescoços e suas cabeças elegantes para fora. Uns levantavam vôo só para mais na frente retornar. E o Sol continua caindo. Eu ando e observo uma guriazinha de cabelos loiros enrolados e olhos castanhos falantes jogar uma brinquedinho que cai junto a mim. Quando devolvo para ela seus olhinhos falam que algo na minha bolsa chamou sua atenção. Era uma bolsinha indiana, pequena e leve, mas cheia de estampas e adereços, e com cinco pequenos espelhos organizados em círculo. Eram eles que a fascinavam. - Olha você aqui - eu disse apontando para o espelho. Ela abre um sorriso feliz, mas aquela felicidade extrema que as crianças sentem com as coisas pequenas. Como eu queria nascer de novo. É impossível não se contagiar. Não dá para olhar para uma criança e não sorrir para ela, porque toda vez que vejo uma me lembro da felicidadezinha infantil que ela deve estar sentindo o tempo todo. E elas sorriem de volta, e é aí que eu confirmo o que se passa nesse mundinho delas. Eu então passo a bolsa para ela. Coloco em seus ombros. A bolsa fica batendo no chão. Ela olha para si, se achando grande, e por um momento parece satisfeita. Mas logo me devolve. Acho que não tem graça crescer! E o sol continua girando. Pergunto o nome dela, é Bianca. - Tchau Bianca - digo eu. - Tchau - diz ela com os típicos problemas fonéticos das crianças pequenas. Acena com sua mãozinha como também as crianças fazem, sem muita segurança, não de modo firme, mas uma dancinha alegre e espontânea suas mãos fizeram. Vermelhos, laranjas, rosas, azuis, a bola de fogo continua caindo, e as cores se misturam de forma cada vez mais frenética, até que nada resta, só o cinza e o negro, e o adeus de uma mão infantil.

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