...Raquel não subia mais no palco. Mas sentia falta. Sentia falta da mágica mais do que tudo. Não da mágica do amor, na qual ela não acreditava, mas na dele. Ele era um passe de mágica. E era esse o fascínio que exercia. Ninguém entendia o truque. Ele era indecifrável. E ela não queria entender. Todo o prazer estava em ver algo extraordinário, e para isso não se importava em ser voluntariamente enganada. Raquel amava a mágica. E ela bem sabia que em todo bom truque existem 3 atos. No primeiro, chamado “A Promessa”, o mágico revela algo ordinário, mas que por sua natureza não o é. Mostra os homens e as cartolas e as mulheres. No segundo, “A Virada”, o mágico faz esse objeto ordinário fazer algo extraordinário. Faz os homens desaparecem, tira os coelhos das cartola e corta as mulheres ao meio. Após o assombro, após a tentativa fracassada de encontrar uma explicação, de vislumbrar o segredo, vem o terceiro e último ato, “A Fascinação”. “A Fascinação" é o momento das reviravoltas, quando o seu próprio assombro se assusta, é o momento das respirações suspensas no silêncio do espanto. É aqui que os homens retornam, que a mulher se mostra inteira, e que a cartola volta para a cabeça do mágico. Mas Raquel não tinha mais forças para aplaudir. Não dessa vez. Mesmo que continuasse amando a mágica. Mesmo que não ligasse para o espetáculo fracassado. Mesmo que não soubesse que a promessa era falsa. Mesmo que não sentisse que a virada era brusca. Mesmo que não pudesse ver a mulher cortada. Mesmo que não sofresse pelo homem que não voltava. E mesmo que não sentisse na fascinação o embuste. Ela amava a mágica mais do que tudo. Mas não tinha mais forças para nada. Ela não iria aplaudir. Não dessa vez.
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