terça-feira, 21 de abril de 2009

terceira inconveniência

Já tinha perdido três quilos desde que começara a esfriar. Já não acreditava quando diziam que no frio se come mais. Como também não acreditava quando ouvia que ele não iria chegar a tempo da sessão das dez, que o encontro no bar depois daquele dia chato de trabalho chato de vida chata não iria acontecer - fica pra próxima, ele dizia. Sabia que as razões eram reais, que os compromissos eram verdadeiros. O trabalho, o projeto novo, o ensaio da banda, a vontade de dormir e pronto. O que ela não acreditava era na não-verdade que ela tinha se tornado, era na sua não-existência. Já não tinha mais apetite para o que lhe parecia trivial. Não tinha apetite pra pedir. Pedia para não ouvir mais sua ausência e estava, gradualmente, perdendo os contornos, as linhas, as expressões. A imagem construída, antes projetada na tela grande, perdia o foco. E não fazia nada disso de propósito. Fazia pelo simples fato de não saber. Tinha perdido três quilos de vontade, três quilos de interesse e carregava tudo nas suas três toneladas de vida -ganhava o peso do tempo com aquele inexistir que não era dela.

Um comentário:

  1. tá nascendo, respira nas contrações...tá quase lá, to vendo a cabeça coroando...heheh

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